
No meu artigo anterior, O fundo do poço, falei sobre o exemplo do profeta Jeremias. Ele foi capaz de sofrer as consequências de ser fiel no seu ministério. Esse artigo terminou com o grande desafio de pregarmos a palavra de Deus, sem rodeios nem floreados. Mas, como se diz normalmente: é muito fácil falar. O difícil é fazer!
Quando revemos histórias como a de Jeremias, podemos facilmente pensar que ele tinha condições mais favoráveis que as que temos hoje. Afinal, Deus falava com ele diretamente. Mas será que o facto de ouvir Deus diretamente tornou as coisas assim tão mais fáceis? Quando Deus falou com Jeremias pela primeira vez, ele ainda era uma criança. Nessa altura, vemos que a atitude inicial foi bem diferente da que vimos no artigo anterior.
“Então disse eu: Ah, Senhor DEUS! Eis que não sei falar; porque ainda sou um menino.”
Jeremias 1:6
Como é que alguém que dá este tipo de desculpas, pode ser usado por Deus da forma que Jeremias foi?
A resposta inicial
A resposta inicial de Jeremias ao seu chamado é semelhante à de Moisés:
“Então disse Moisés ao Senhor: Ah, meu Senhor! eu não sou homem eloquente, nem de ontem nem de anteontem, nem ainda desde que tens falado ao teu servo; porque sou pesado de boca e pesado de língua.”
Êxodo 4:10
Em ambas as situações, Deus responde da mesma forma, mostrando que é Ele quem coloca as palavras na boca dos seus servos. A mensagem é dEle. O interesse em transmitir essa mensagem também é dEle. Por isso, Ele garante que a falta de eloquência do mensageiro não irá ser um obstáculo.
O seu percurso
Após a resposta de Deus, Moisés e Jeremias tiveram atitudes diferentes. Jeremias parece aceitar logo o desafio, enquanto que Moisés pediu que fosse enviada outra pessoa. Porém, ao longo do seu ministério, vemos Moisés assumir plenamente a sua missão.
Porque Jeremias aceitou o desafio, Deus prometeu-lhe:
“Tu, pois, cinge os teus lombos, e levanta-te, e dize-lhes tudo quanto eu te mandar; não te espantes diante deles, para que eu não te envergonhe diante deles.
Porque, eis que hoje te ponho por cidade forte, e por coluna de ferro, e por muros de bronze, contra toda a terra, contra os reis de Judá, contra os seus príncipes, contra os seus sacerdotes, e contra o povo da terra.
E pelejarão contra ti, mas não prevalecerão contra ti; porque eu sou contigo, diz o Senhor, para te livrar.”
Jeremias 1:17-19
O ministério de Jeremias durou mais de 40 anos. Começou no décimo terceiro ano do reinado de Josias, rei de Judá, em 627 AC. No décimo primeiro ano do rei Zedequias, em 586 AC (Jeremias 1:2-3), quando a cidade de Jerusalém foi conquistada por Nabucodonosor, o seu ministério sofre uma grande alteração. Ele é levado para o Egipto e o seu ministério deixa de estar focado em Judá e passa a ser mais abrangente (Jeremias 43:6).
Muitos dos personagens bíblicos passaram por longos períodos de treino, provas e situações marcantes. Raramente as suas vitórias aconteceram repentinamente. A sua grande coragem, exemplo e dedicação foi fruto de uma relação continuada com Deus. Na minha e na tua vida acontecerá da mesma forma! As nossas vitórias e os nossos fracassos serão o resultado do nosso percurso com Deus. Uma coragem como a de Jeremias demorará tempo a ser construída.
Segundo a tradição registada em livros extra-bíblicos, Jeremias morreu apedrejado no Egipto[1]. Tendo em conta a coragem e a frontalidade registadas no seu livro, é provável que esta tradição seja verdadeira.
Um dos dias mais tristes da sua vida terá sido quando viu a destruição do Templo, relatado no capítulo 52 do seu livro e também em 2 Reis 25. Estes dois capítulos são muito idênticos. O percurso difícil do seu ministério também está refletido no livro de Lamentações.
Mas foi tudo mau?
Segundo os padrões atuais, o ministério de Jeremias foi um autêntico fracasso. Apesar de toda a sua ousadia, o povo de Judá acabou por não se arrepender e buscar o perdão de Deus. Por isso, foi exilado para a Babilónia, como Deus tinha avisado.
Contudo, Deus não mediu o sucesso do ministério de Jeremias da mesma forma. Do mesmo modo, o sucesso do ministério que Deus te confiou não se vai medir pelo resultado estatístico. Ele é quem fará a avaliação e a Sua matemática é um pouco diferente da nossa. E tu, como avalias o teu ministério?
Os muitos resultados que vês, ou falta deles, são um indicador relevante?
Os frutos do nosso trabalho são relevantes mas não são o único indicador usado por Deus na avaliação. Na verdade, o uso que fazemos com os dons e o ministério que nos foi confiado são bem mais importantes. A caminhada que fazemos com Aquele que nos deu esses dons e ministério é bem mais importante!
No chamado capítulo da fé, apesar de Jeremias não ser referido explicitamente, Deus inspirou o autor a escrever acerca dos profetas que venceram reinos. Jeremias enfrentou as pessoas mais importantes do seu povo e venceu porque o Senhor foi com ele.
“E que mais direi? Faltar-me-ia o tempo contando de Gideão, e de Baraque, e de Sansão, e de Jefté, e de Davi, e de Samuel e dos profetas,
Os quais pela fé venceram reinos, praticaram a justiça, alcançaram promessas, fecharam as bocas dos leões,”
Hebreus 11:32,33
Para Deus, Jeremias cumpriu tudo aquilo que lhe foi proposto, mesmo que para todos os outros o seu ministério tenha sido um fracasso. É que os vários avaliadores usam indicadores e matemáticas bem diferentes!
Quem é o avaliador que buscas para o teu ministério?